Quando há dois meses atrás Theresa May convocou eleições antecipadas, estava longe de pensar que o resultado seria este. Para além de não conseguir reforçar a posição do Partido Conservador e assim legitimar a negociação do Brexit, acabou mesmo por perder a maioria detida no Parlamento e criar uma incerteza nos mercados que voltou a afundar a libra.
Os resultados
Apesar de sondagens e estudos de popularidade darem inicialmente a May uma vantagem de 24 pontos relativamente ao candidato trabalhista, frequentemente descrito como eleitoralmente impopular, parece que afinal as campanhas e programas eleitorais tiveram algum peso na decisão do eleitorado, aproximando Jeremy Corbyn da líder do Partido Conservador. Em consequência, após a divulgação do resultado de uma sondagem à boca das urnas por três estações televisivas britânicas – BBC, ITV e Sky – a libra inglesa perdia mais de dois cêntimos contra o dólar.
Em questão estava a perda da maioria absoluta do Partido Conservador na Câmara dos Comuns, que se viria posteriormente a confirmar: estes alcançavam 318 lugares, menos 13 que nas eleições anteriores, face ao Partido Trabalhista de Corbyn, que via aumentada a sua representação em 32 assentos, obtendo um total de 262. O Partido Nacionalista Escocês (SNP) foi outro grande perdedor dessa noite, deixando escapar 19 lugares dos 54 que detinham. Já os liberais conquistaram mais 3 assentos (num total de 12) e outros 13 foram repartidos por diferentes forças partidárias. Os unionistas da Irlanda do Norte (DUP), com os quais Theresa May afirmou já ter estar em negociações para fechar um acordo que lhes outorga “legitimidade e capacidade para […] controlar uma maioria na Câmara dos Comuns”, também aumentaram a sua representação em 2 lugares, obtendo um total de 10.
O sucesso de Corbyn deveu-se em parte à defesa de políticas sociais como a eliminação das propinas, a nacionalização dos transportes e o investimento nos serviços públicos. Já as políticas mais conhecidas dos conservadores eram a aplicação do “imposto sobre a demência” e o regresso da caça às raposas.
As consequências
O Brexit
A escassos dias do início das negociações entre o Reino Unido e a União Europeia sobre o Brexit (já no próximo dia 19 de junho), estes resultados eleitorais lançam alguma incerteza sobre todo o processo. Segundo Tim Bale, professor de ciência política da Queen Mary University, as consequências políticas podem passar pelo adiamento do início das negociações ou mesmo a convocatória de novas eleições, caso a UE não acredite na robustez do governo. Este pode também deixar de sentir que tem mandato e condições políticas para avançar com um Brexit mais duro, que passe, por exemplo, pela saída do mercado único.
Azad Zangana, economista e estratega europeu, coloca também algumas dúvidas sobre o futuro de Theresa May à frente do Partido Conservador: “isto [resultados eleitorais] sugere um governo menos estável, que terá que fazer concessões e procurar um consenso até para introduzir pequenas alterações à legislação”.
A queda da libra
A incerteza provocada pelos resultados eleitorais também se refletiu nos mercados. As opiniões dos investidores dividem-se quanto ao modo como os primeiros afetarão a negociação do Brexit: de um lado estão os que acreditam que o enfraquecimento da posição conservadora conduza a um Brexit mais suave e portanto melhor para a economia; de outro estão os investidores que pensam que a situação só poderá tornar a negociação mais difícil e imprevisível.
Este nível de incerteza fez com que a libra (GBP) perdesse, na passada sexta-feira, pelo menos 3 cêntimos relativamente ao dólar, de $1.2957 para $1.2636. À hora do fecho, já teria recuperado para $1.2741. Apesar de significativa, a descida não é tão dramática como a ocorrida após a decisão do Reino Unido de abandonar a União Europeia. Nessa altura a descida foi de 17 cêntimos, de $1.50 para $1.33.
Efeitos sobre a economia britânica
Como consequências da perda de valor da divisa inglesa, esperam-se diversos efeitos na economia do Reino Unido. Um dos mais importantes será o aumento do custo de vida, devido à inflação produzida pela desvalorização da libra e ao incremento do custo das importações. Produtos como o petróleo e combustíveis, cotados internacionalmente em dólares, serão os primeiros a sofrer este aumento. Pelo contrário, e a longo termo, uma libra mais fraca potenciará o aumento das exportações do país.
A queda da libra também tornará o turismo e os negócios britânicos mais atrativos. O primeiro já tinha experimentado um aumento significativo (mais de 10%) após o referendo sobre o Brexit, enquanto algumas empresas do Reino Unido, como a Arm Holdings e a Unilever, foram compradas por gigantes internacionais.
A perda de valor da libra terá ainda efeitos nos ganhos das empresas: multinacionais britânicas que obtenham a maior parte dos seus rendimentos fora do Reino Unido sairão beneficiadas quando estes forem convertidos em libras; pelo contrário, empresas não-britânicas verão os dividendos obtidos no Reino Unido decrescer.
